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Sem monogamia | Mãe diz a filhos que ela e marido fazem swing

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Marina Rotty com Ramon, Marcio e Renan — Foto: Jaiel Prado

Marina Rotty e seu marido, Márcio, estão casados há 25 anos e praticam troca de casais há 18. Por muito tempo, ela teve medo de não ser aceita pelos filhos e passou a introduzir a eles, desde a infância, o respeito às pessoas e seus desejos. Agora, ela conta como foi quebrar o silêncio e de que forma isso mudou a relação com seus filhos

“Era 2006 quando meu marido, Márcio, e eu decidimos ir a uma casa de swing pela primeira vez. Estávamos casados há sete ou oito anos. Nunca tinha nem ido em balada: sempre fui de igreja, meu marido também, e a gente não bebia nada de álcool, tínhamos várias restrições. Fomos por curiosidade e achamos tudo diferente. Ficamos numa salinha tomando refrigerante e assistindo aquilo [risos].

Na volta para casa, parecia que a gente tinha voltado a ter 16 anos, e vimos que nossa vida sexual ficou muito mais ativa. Mas como isso era possível? A gente nem tinha feito nada. Nossa relação era bacana, estávamos sempre juntos. Nada nos faltava, não teve essa coisa de cair numa rotina, nada disso. Por isso que foi intrigante. É um senso comum pensar que temos que procurar coisas diferentes porque algo não está bom no relacionamento.

Voltamos muitas vezes às casas de swing e vimos que isso fazia bem para o nosso casamento. Pesquisamos mais e conhecemos as comunidades, fui percebendo que não se tratava apenas de sexo, tinha toda uma filosofia e um contexto por trás. De lá para cá, a gente foi se soltando. Tem muitas fases nesse processo de transição: começamos como swingers, há um tempo nos entendemos como um casal liberal, mas hoje a gente se vê como um casal não monogâmico consensual.

Tudo isso começou quando meus filhos eram crianças, bem pequenininhos. Hoje o Renan tem 21 anos e o Ramon, 18. Minha profissão inicial era musicista, mas aos 30 – em meio a descoberta do swing – mudei para psicologia.

Comecei a estudar, mudar minha forma de pensar e ver o mundo e a vida. Foi quando tive o estalo: precisava preparar os meus filhos para quando fôssemos contar a eles sobre o casamento não monogâmico. Claro, eu não tinha como sair falando que fazíamos troca de casal [risos]. Além do mais, por fora, nossa vida era muito tradicional. Tinha medo de que, se soubessem, os parentes pudessem entrar na Justiça para pedir a guarda dos dois. Não podia permitir isso.

Passei a educá-los sobre respeito ao que é diferente, ensinei sobre diversidade em todos os âmbitos e também passei a respeitá-los em suas decisões, mesmo que fossem mínimas ou da realidade infantil em que viviam. Tive muitos amigos LGBTQIA+ que se assumiram ao longo dos anos, e eles também tiveram. Aproveitava isso para puxar assunto.

Lembro que, às vezes, estávamos no carro e começava a tocar aquela música do Seu Jorge: ‘Ela é amiga da minha mulher, pois é, pois é…’. Eu puxava: ‘E aí, o que vocês acham disso? Por que esse casal da música tem que conversar sobre? Por que ele não pode ficar com as duas?’. Eles tinham 12, 13 anos, mas queria saber o que pensavam.

Os feedbacks eram sempre no sentido de que estava tudo bem, que é preciso respeitar as pessoas. Nesse caso da música, um deles me respondeu que não tinha problema nenhum, desde que as três pessoas estivessem de acordo.

Mais tarde, começamos a trabalhar com isso. Fizemos um blog, tínhamos vídeos e fotos, começamos a dar entrevistas para falar de não monogamia. Mas nossa identidade não era revelada, estávamos sempre de peruca ou de óculos. Na época da pandemia, uma entrevista específica que demos ganhou uma visibilidade bem grande. As pessoas no entorno (família, amigos, conhecidos da igreja) começaram a descobrir e foi quando decidimos que estava na hora de os dois saberem por nós.

Decidir contar foi difícil, não sabíamos o que ia acontecer. Eu tinha medo de não aceitarem bem. Se fosse um irmão ou outro parente com quem não tenho convivência é uma coisa, agora os filhos… Somos responsáveis por eles. Imagina se não aceitassem? Márcio e eu nos preparamos para o pior, inclusive.

Sentamos no sofá da sala e chamamos os dois. ‘Olha, temos uma coisa muito importante para falar com vocês’, dissemos, bem sérios. O Ramon, meu caçula, falou ‘Meu Deus, vocês estão com covid?’. Falei que não, que era algo a respeito do meu relacionamento com o pai deles. ‘Ah, então eu já sei’, ele respondeu. Tomei um susto, o Márcio também. Sabe quando o jogo inverte?

‘Como assim você já sabe?’

‘Vocês vão falar do blog de vocês. Olha, eu já vi, li, sei que vocês têm vídeos, fotos, entrevistas…’ Depois, ele e o irmão começaram a conversar com muita naturalidade na nossa frente. E Márcio e eu parados. ‘Tá tudo bem’, eles falaram para nós.

Ficamos surpresos, sem palavras. Comecei a dar risada porque era uma situação que nos preocupamos tanto e, no fim, foi muito tranquila. Eles só viraram para a gente e disseram: ‘Para com isso, vocês são felizes. Enquanto todos os nossos amigos estão com os pais separando vocês estão aqui, felizes e juntos.’

Outra coisa que aconteceu: Marina não é meu nome real. O de registro é Eucilene. É um nome muito diferente, e quando começamos no swing, eu troquei para me preservar. Acabou virando uma marca. Perguntei para os meninos como eles queriam me chamar, se de Marina ou de Eucilene. Eles falaram: ‘A gente vai te chamar de mãe’. Isso mostra como o preconceito está na cabeça da gente, não na deles.

Contar para eles mudou tudo na nossa relação. Viramos outra família, e nos tornamos muito mais abertos e transparentes uns com os outros. Nós éramos Adventistas do Sétimo Dia, e não podíamos comer carne de porco. O Renan, que estuda gastronomia, sempre amou cozinhar, e um dia me disse que o sonho dele era comer bacon.

Um ano e meio depois, ele veio me contar que é bissexual. Senti que foi difícil para ele falar, e que teria sido mais se não tivéssemos conversado antes. Ele estaria num sofrimento solo, podia entrar em depressão. Falei ‘Tá tudo certo’. Sabe quando a pessoa respira aliviada? Foi a mesma coisa com a gente.

Parte do porquê ficamos com esse medo foi o julgamento das outras pessoas. O Brasil é um país muito conservador. Exemplo disso é que, ao longo desses anos, convivemos com pelo menos 300 casais. Desses, só três assumem para os outros. Todos os outros não conseguem, morrem de medo ou de perder o respeito, de perder o emprego ou de perder o status. Na cabeça da gente, é como se só fosse ter perda justamente por causa desse preconceito que existe, sim.

Em relação à religião, por muito tempo não tivemos problema para conciliar as duas coisas. Porque estávamos fazendo algo consensual, não estávamos traindo nem fazendo nada de errado. Pelo contrário: com o blog, ainda ajudamos muitas pessoas, casais que gostariam de abrir o relacionamento.

Para mim, a base de toda religião é o amor ao próximo, é fazer o bem – e estávamos fazendo o bem, para nós e para os outros. Eu era uma pessoa muito conhecida ali dentro, e quando o pessoal da igreja descobriu, fiquei muito desiludida. Pensei que éramos uma comunidade, formada por apoio mútuo e conversas. Mas não tive isso, ninguém quis entender. Ouvi de muitas pessoas próximas que eu tinha morrido para elas.

Foi quando vi que a religião não é o meu caminho. O Márcio ainda acredita, frequenta de vez em quando, mas percebi que isso aí não tem nada a ver com amor e religião. Meus filhos também saíram da igreja. Se acredito em Deus? Não sei. Estou me descobrindo.

Sim, à primeira vista nós somos uma família comercial de margarina. E as pessoas desconfiam, pensam que tem algo de errado. Quando dizemos que nosso casamento é aberto, elas dizem que sabiam que tinha algo de errado. Então, o preconceito realmente é muito grande. Nesse momento, minha luta é focar no meu trabalho e mostrar que a não monogamia é só uma opção de vida. Ninguém precisa seguir a não monogamia ou abrir o relacionamento, mas fazer o que traz felicidade e respeitar todas as formas de se relacionar. Todas são válidas.

Mas, de verdade, acho que as próximas gerações não vão precisar passar por isso. Até pela aceitação dos nossos filhos e dos amigos deles, vejo que não vai existir mais todo esse peso em cima do tipo de relacionamento que alguém escolhe ter. Acho que esse preconceito é uma coisa que vai morrer na nossa geração. Tomara.”

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