Sob a justificativa de atrair investidores e destravar a atividade econômica em geral , o presidente Jair Bolsonaro (PSL) assinou, no fim de abril, a medida provisória 881, apelidada de MP da liberdade econômica , que deve mudar as leis trabalhistas.
arrow-options Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Propostas previstas na MP da liberdade econômica podem colocar em risco os direitos trabalhistas, segundo MPT
Enviado pela equipe econômica do governo ao Congresso, o texto deve ser votado até o dia 27 de agosto para não perder a validade. A previsão é que a isso aconteça nesta terça-feira (13) na Câmara dos Deputados.
O documento foi editado recentemente por diversas vezes pelo relator, deputado Jerônimo Goergen (PP-RS). Em seus últimos ajustes, foram retirados trechos que poderiam causar resistência e atrapalhar a aprovação da matéria, conforme sua avaliação.
Se aprovada, a medida deve afetar diretamente a vida do trabalhador, já que prevê mudanças como a flexibilização da jornada aos domingos e feriados, com pelo menos um domingo de folga a cada quatro semanas, além de permitir a extinção do ponto eletrônico.
De acordo com o secretário especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, Paulo Antônio Spencer Uebel, as novas medidas implantadas podem gerar 3,7 milhões de novos empregos em 10 anos e um crescimento de 7% no Produto Interno Bruto (PIB), segundo pesquisa realizada pelo Ministério da Economia.
“O Brasil ocupa a 150ª posição no mundo em relação à liberdade econômica e a 109ª colocação em termos de facilidades para se fazer negócios”, afirmou Uebel, durante plenária realizada pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP), na última quinta-feira (8). Ele acredita que a MP deixa o estado “mais técnico, mais eficiente e mais focado em prestar um serviço eficiente ao cidadão”.
O Ministério Público do Trabalho (MPT), contudo, vê a minirreforma trabalhista como ameaça para os direitos trabalhistas , afirmando que há, inclusive, pontos inconstitucionais, colocando em risco a saúde e a segurança dos empregados, conforme defendeu em nota.
Goergen reconheceu as críticas da oposição e chegou a alterar o texto mais uma vez ainda na tarde desta terça-feira. Por conta das atualizações e recuo do governo, a previsão para votação deve ser adiada.
Trabalhador não terá que bater ponto, caso haja acordo com o empregador – o que dificulta o pagamento de hora extra
Trabalho aos domingos sem pagamento em dobro
No texto, uma das alterações que mais chama a atenção trata do trabalho aos domingos e feriados para todas as categorias – incluindo professores, que poderão ministrar aulas nesses dias. A MP 881 também permite que bancos funcionem aos sábados.
A proposta continua garantindo que o trabalhador tenha direito a uma folga semanal, mas esse descanso só terá que, necessariamente, cair em um domingo uma vez a cada quatro semanas. O relator havia aumentado o intervalo, que antes obrigava folga no domingo a cada sete semanas, mas voltou atrás nesta terça-feira.
Dessa maneira, ao conceder descanso em outro dia, o empregador não precisará fazer o pagamento em dobro pelo domingo trabalhado. Isso significa que trabalhar aos domingos não será mais “financeiramente vantajoso” ao empregado.
Para o Ministério Público, essa concessão de trabalho aos domingos “de forma indiscriminada e sem que ocorra qualquer tipo de necessidade imperiosa” vai contra a Constituição “que determina que o repouso semanal remunerado deve ocorrer, preferencialmente, aos domingos”.
Se aprovada, a MP da liberdade econômica também permitirá que o ponto eletrônico só seja obrigatório para empresas com, no mínimo, 20 funcionários. Hoje, se tiver mais de dez trabalhadores, o controle de horários de entrada e saída dos colaboradores é exigido.
O texto também prevê o controle de ponto por exceção, em casos de acordo entre patrão e funcionário, que pede o registro do ponto apenas em situações atípicas, quando a carga horária fugisse do habitual e dispensa o controle formal nos demais dias.
A ideia, segundo o governo, é diminuir a burocracia e não reduzir os direitos. No entanto, dificulta a fiscalização para pagamento de horas extras e aumentar jornadas de trabalho.
Empresas não serão multadas de primeira
A fiscalização de irregularidades também pode mudar. A MP quer que a autuação, em caso de infrações por parte das empresas, tenha uma segunda visita dos órgão fiscalizador. Dessa forma, a multa não acontece mais na hora, como é atualmente, e dá tempo para a empresa reparar o erro. O objetivo é orientar primeiro.
No atual sistema, a dupla visita só é recomendada a companhias recém-inauguradas, às micro e pequenas empresas e em caso de leis novas.
As únicas exceções previstas pela MP da liberdade econômica são em caso de trabalhadores sem carteira assinada, trabalho infantil e trabalha análogo à escravidão.
Recuo do governo
Ainda nesta tarde, o relator chegou a retirar uma medida que se referia a quem recebe remuneração superior a 30 salários mínimos (R$ 29.940). O governo propunha que esses trabalhadores seriam contratados com regras diferentes, regidos pelo Direito Civil, sem a aplicação da CLT. Nesses casos, ficariam garantidos apenas os direitos do artigo 7º da Constituição.
Isso significa que, os 30 dias de férias e intervalos no meio da jornada, como o horário de almoço, por exemplo, não seriam mais obrigatórios.
A alteração aconteceu devido à pressão dos aeroviários. Segundo Goergen, o apelo veio dos pilotos da aviação, devido a atual situação do setor aéreo “especialmente em relação a uma das empresas, que tem um problema mais grave, e poderia trazer prejuízo a milhares de trabalhadores”.
arrow-options Jefferson Rudy/Agência Senado – 1.1.14
Bolsa Família
O governo Jair Bolsonaro estuda implementar um regra de “meritocracia” por desempenho de alunos para a distribuição de renda para famílias pobres por meio do novo Bolsa Família. A ideia é conceder um percentual a mais no benefício para estudantes que concluírem o 3º ano, 6º ano, 9º ano do Ensino Fundamental, e o 1º ano, 2º ano e 3º ano do Ensino Médio.
A medida faz parte da reformulação do programa criado em 2003 na gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que deverá ser rebatizado como Renda Brasil. O novo nome, no entanto, depende do aval do presidente Bolsonaro. Há a expectativa de que versão do atual governo para o Bolsa Família possa a ser apresentado ainda neste ano.
A proposta de incentivo está sendo desenhada pelo Ministério da Cidadania, mas ainda passa pelos acertos finais com a Casa Civil e Ministério da Economia. Procurada, a pasta comandada pelo ministro Osmar Terra, responsável pelo Bolsa Família, não deu detalhes da transferência de recursos.
Desde agosto, os três ministérios discutem uma ampla reformulação do Bolsa Família como forma de criar uma “marca social” do governo Bolsonaro até agora caraterizado por ajustes fiscais, como a reformas da Previdência , já em vigor, e as promessas de reformas tributárias e administrativas.
Outras medidas que estão em debate é a injeção de mais recursos e a aplicação de novos critérios para a transferência de renda para famílias pobres. Além da regra de meritocracia para alunos, também estão sendo avaliados o repasse de benefício para famílias com crianças na primeira infância, com até 36 meses, e para jovens até 21 anos.
Em 2019, o orçamento do Bolsa Família é de R$ 29,4 bilhões. Em outubro, o programa beneficiou 13,5 milhões de famílias, que receberam R$ 189,86, totalizando um total de R$ 2,5 bilhões.
Em 2020, o governo reservou R$ 30 bilhões para o programa. Nesses valores, porém, não está previsto uma promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro, que é criar um 13º pagamento para o Bolsa Família .